A MULTA DE 2% E AS LOCAÇÕES E COTAS CONDOMINIAIS
1. A Lei nº 9.298, de 1º de agosto de 1996, vigente desde
o dia 02.08.96, data da sua publicação no D. O. U.
deu nova redação ao parágrafo 1º do art.
52 da Lei nº 8.078/90, que dispõe sobre a proteção
do consumidor, cujo dispositivo passou a ter a seguinte redação:
"Art. 52 - No fornecimento de produtos ou serviços
que envolva outorga de crédito ou concessão de financiamento
ao consumidor, o fornecedor deverá, entre outros requisitos,
informá-lo prévia e adequadamente sobre:
Parágrafo 1º - As multas de mora decorrentes do inadimplemento
de obrigações no seu termo não poderão
ser superiores a 2% (dois por cento) do valor da prestação."
2. Dispõe, ainda, a mencionada Lei nº 9.298/96 que
ela "entra em vigor na data da sua publicação"
e que "revogam-se as disposições em contrário".
3. Para este estudo interessa saber se as multas contratuais das
avenças locatícias e as multas condominiais sofrerão,
ou não, essa limitação de não poderem
ser superiores a 2% ( dois por cento). Vamos demonstrar que essa
limitação não alcança os contratos de
locação e nem as convenções e deliberações
dos condôminos de edifícios em geral.
4. Antes, porém, é conveniente gizar-se que o Código
de Defesa do Consumidor regula a relação jurídica
que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário
final"(art. 2º), sendo certo que também define
que "fornecedor é toda pessoa física ou jurídica,
pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os
entes despersonalizados, que desenvolvem atividades de produção,
montagem, criação, construção, transformação,
importação, exportação, distribuição
ou comercialização de produtos ou prestação
de serviços". (art. 3º).
Pela simples leitura dessas definições legais constata-se
que o locador não se enquadra na figura de fornecedor, porque
não desenvolve nenhuma das atividades elencadas no apontado
artigo 3º da Lei nº 8.078/90, e nem o locatário
porque não adquire ou utiliza produto ou serviço emanado
do locador.
O mesmo ocorre entre os condôminos de um edifício,
já que entre eles não se verifica aquisição
ou utilização de produtos ou serviços, e nem
entre eles próprios são desenvolvidas as atividades
mencionadas no pré-falado artigo 3º.
Ademais, a redação do mencionado parágrafo
1º deverá ser lida em consonância com o disposto
no texto do próprio artigo 52, onde está regulado
que o fornecimento de produtos ou serviços que envolva outorga
de crédito ou concessão de financiamento ao consumidor,
hipóteses esssas que não se verificam entre locador
e locatário e entre os próprios condôminos em
edificações ou conjunto de edificações.
Inexistindo outorga de crédito ou concessão de financiamento
entre fornecedor e consumidor, como de fato inexiste nas relações
locatícias e condominiais, por óbvio é inaplicável
a regra do artigo 52 e seu parágrafo 1º tenha este qualquer
tipo de redação, seja a anterior contendo multa de
10%, seja a nova prevendo multa de 2%.
5. Se não bastassem essas límpidas normas legais,
pelas quais certifica-se a não incidência das regras
do Código de Defesa do Consumidor às relações
jurídicas de locação e condominiais, e já
basta, é conveniente relembrar-se, porque certos setores
estão dele "esquecidos", o preceito constitucional
de que "ninguém é obrigado a fazer ou deixar
de fazer alguma senão em virtude de lei"(art. 5º,
inciso II).
Portanto, a limitação da multa a 2% (dois por cento)
está endereçada ao campo das relações
reguladas pelo mencionado Código de Defesa do Consumidor,
ficando as demais relações fora desse alcance, a uma
porque não reguladas pelo mencionado código e a duas
porque não há lei que imponha esse percentual aos
contratos locatícios.
6. Ademais, a relação de locação é
regulada por lei especial, a qual permite sejam cobradas do locatário
"as multas ou penalidade contra tuais, quando exigíveis",
consoante disposto no artigo 62, II, alínea "b",
da lei nº 8.245/91, cujas multas não poderão
ser "superiores à importância de 10% do valor
da dívida", conforme disposto no artigo 9º do Decreto
nº 22.626/33, de 7 de abril de 1933, vigente no ordenamento
jurídico, porque até a presente data não revogado
por lei posterior que expressamente o declarasse, ou fosse com ele
incompatível, ou que regulasse inteiramente a matéria
de que trata o mencionado Decreto nº 22.626/33, conforme comando
inserto no parágrafo 1º do art. 23º da Lei de Introdução
ao Código Cívil (Decreto-Lei nº 4.657, de 04.09.42).
7. Por outro lado, a relação condominial é
também regulada por outra lei especial a qual prevê
que "o condômino que não pagar a sua contribuição
no prazo fixado na convenção (...), conforme expressamente
previsto no parágrafo 3º do art. 12 da Lei nº 4.591,
de 16.12.64.
8. Consequentemente, por força da especialide das leis reguladoras
das locações dos imóveis urbanos e de condomínio
em edificações, a essas relações jurídicas
não se aplica o teto de 2% na incidência de multas,
podendo, ao contrário, serem elas validamente fixadas em
até 10% (dez por cento) quando se tratar de locação
e de até 20% quando se cuidar de regra condominial.
9. Por oportuno, parece desnecessário lembrar-se que a finalidade
da multa é estimular o devedor locatício ou condominial
a cumprir a sua obrigação no prazo previsto no contrato,
ou na convenção, sendo certo que ao locador, ou ao
condomínio, não há qualquer interesse na existência
de retardo no cumprimento do dever por parte do inadimplente, já
que o que mais importa é a adimplência da obrigação
no prazo, uma vez que tanto o locador, quanto o condomínio,
necessitam das verbas de aluguel e da cota condominial para arcarem
com os seus respectivos compromissos financeiros nos prazos a que
estão sujeitos.
10. Diante dos antes mencionados textos legais, constata-se serem
inteiramente impertinentes as opiniões vistas na mídia,
mormente partidas de autoridades ligadas a órgãos
de defesa do consumidor, sob os mais pífios argumentos, de
que esse novo percentual de 2% passará a incidir nas relações
locatícias e condominiais, valendo, até mesmo, indagar-lhes
porque desde a vigência da Lei 8.078/90?...
Se assim não agiram, porque, à evidência, está-se
diante de relações jurídicas distintas, por
isso não cabe, agora, esse vozerio não jurídico,
já que a nova Lei nº 9.2398/96 apenas estabveleceu outro
percentual para as mesmíssimas situações antes
já reguladas pelo artigo 52 da Lei nº 8.078/90, não
modificado pela menciondada nova Lei nº 9.298/96.
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