CRECI J4501

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 




 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 




 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

A responsabilidade do fiador locatício

determinada pela Terceira Seção do STJ

no ERESP N° 566.633

 

Geraldo Beire Simões

Presidente da ABAMI

 

 

1.         Embora decorrente de uma verdade tão simples, ditada por Daví  Barela Dávi e José Paulo Koch  ( DIARIO DAS LEIS IMOBILIÁRIO BDI, 1° Decêndio Abril/2002) no sentido de que “A fiança,  em matéria de locação, sempre possui prazo determinado, inobstante incerto, pois sua extinção somente se dará após a efetiva devolução do imóvel locado, salvo estipulação expresso em contrário.” ,  lamentavelmente alguns desavisados julgadores, saindo da rota da correta aplicação da regra disposta no art. 39 da Lei n° 8.245/91,  tal qual saiu o “Legacy”,  ou seja mantendo os seus “transponder” desligados,  passaram a dizer que a responsabilidade do fiador se extinguiria quando terminado o prazo determinado  da locação.

 

 

            Esses julgados, além de não cumprirem a regra expressa contida no pré-falado art. 39 da Lei do Inquilinato  -  o que não é permitido ao julgador proceder, diante da regra processual no sentido de que cabe-lhe aplicar as normas legais, consoante disposto na segunda parte do art. 126 do Cód. Proc. Civ.   -  desconheceram que a lei do inquilinato é lei especial,  e como tal respeitada até pelo Código Civil de 2002 ao afirmar no seu art. 2.036 que  “A locação do prédio urbano, que esteja sujeita a lei especial, por esta continua a ser regida”.

 

 

 

            Ora, a lei especial do inquilinato possui regras próprias  tanto materiais quanto processuais, por isso que as regras do Código Civil e as do Código de Processo Civil  se aplicam à relação de locação  somente  no que for omissa ela lei do inquilinato.

 

 

            Daí a importância das virgulas  apostas após os vocábulos “fiança”  e “locação”  na  parte da frase antes mencionada:  “A fiança,  em matéria de locação, (...).

 

 

            Significa dizer que essa vírgula quer acentuar, e bem acentuado,  que a fiança  no contrato de locação não está subjungida às regras do Código Civil, cujas regras se destinam a outras várias espécies de contratos,  contidos no TITULO VI do Código Civil, tais como a compra e venda (arts. 481/504) com as suas cláusulas especiais: a retrovenda (art. 505/508) , a venda a contento e sujeita a prova (arts.509/512), a preempção ou  preferência (arts. 513/520), a venda com reserva de domínio (arts. 521/528), a venda sobre documentos ( arts. 529/532);  a troca ou permuta (art. 533); o contrato estimatório (arts. 534/537); o comodato  (arts. 579/585); a prestação de serviços  (arts. 593/609) ; a empreitada (art. 610/626); o depósito voluntário  (arts.  627/646); o mandato  (arts. 653/691); a comissão  (arts. 693/709);   a agência e distribuição (arts. 710/721); a corretagem (arts. 722/729);  o transporte (arts. 730/756) e a constituição de renda (arts. 803/813).      

 

 

            Por isso,  por ser a lei inquilinária especial com vida própria, reconhecida pelo art. 2.036 do Código Civil, é a ela se aplicam outras regras materiais e/ou processuais somente quando, ela lei do inquilinato, for omissa, conforme disposto no art. 79 da Lei n° 8.245/91. 

 

 

            Ora, em matéria de locação a Lei 8.245/91 dispõe  sobre regra própria e específica sofre fiança,  ao assentar  no seu art. 39 que  “Salvo disposição contratual em contrário, qualquer das garantias da locação se estende até a efetiva devolução do imóvel.

 

 

           

Logo, as regras sobre fiança do Código Civil  não se aplicam ao contrato de locação.

 

 

            Por isso, com  simplicidade,  razão e claridade  de mil sóis,  os  assessores jurídicos Daví  Barela Dávi e José Paulo Koch pontificaram afirmando que  “A fiança, (virgula)  em matéria de locação,(vígula) sempre possui prazo determinado, inobstante incerto, pois sua extinção somente se dará após a efetiva devolução do imóvel locado, salvo estipulação expressa em contrário.”

 

 

            Pois bem.

 

2.         Apesar da clareza da disposição do art. 39 da Lei do Inquilinato alguns desavisados julgadores passaram a entender que a fiança locatícia vigoraria tão somente durante a vigência do prazo contratual, esquecendo-se não somente da regra do aludido art. 39 mas também das disposições    afirmadoras de que  “findo o prazo ajustado, se o locatário continuar na posse do imóvel alugado (...) presumir-se-á prorrogada a locação por prazo indeterminado, mantidas as demais cláusulas e condições do contrato ( § 1° do art. 46 – locações residenciais)  e “presumir-se-á prorrogada a locação nas condições ajustadas, mas sem prazo determinado”  (parágrafo único do art. 56 – locações não residenciais).

 

 

            Vale dizer,  terminados os  prazos certos das locações residenciais e/ou não residenciais, passam a vigorar a prazo indeterminado por expressa determinação legal, até que uma das partes resolva dá-la por findo,  observados os requisitos legais para cada hipótese.

 

 

            Mais ainda:  “mantidas as  demais cláusulas e condições do contrato”  (locações residenciais), ou  “nas condições ajustadas”  (locações não residenciais).

        

 

 

 

 

            Quais são essas “demais clausulas e condições” e “condições ajustadas” ?

 

 

            Dentre outras,  a  cláusula da fiança locatícia.

 

 

3.         Apesar da simplicidade da interpretação dessas regras legais especiais, certos julgadores, conforme já acentuado,  entenderam que a fiança locatícia somente vigoraria durante o prazo determinado da locação !

 

 

            Esqueceram-se das vontades das partes e da lei.

 

 

4.         Tais entendimentos causaram enorme insegurança no mercado de locação, em prejuízo tanto dos locadores que ficaram inseguros em darem seus imóveis em locação, quanto dos locatários que esbarraram nos temores dos locadores, e, em conseqüência, as suas pretensões locatícias nem sempre foram atendidas.

 

 

            E o pior, misturando “alhos com bugalhos” passaram a enxergar nas disposições da Súmula 214 do Superior Tribunal de Justiça o que nela não está escrito e nem pretendido dizer.

 

 

5.         Com efeito, diz a mencionada Súmula 214 : “O fiador da locação não responde por obrigações resultantes de aditamento ao qual não anuiu”

 

 

            Ora, o aditamento” a que se refere a  aludida Súmula 214  é aquele em que importaria em obrigações não inicialmente previstas, tal como, por exemplo, o aumento do aluguel sem a participação do fiador, porque, à evidência ele assumiu o ônus de garantir determinado valor de aluguel inicialmente pactuado e aqueles decorrentes de reajustamentos  na periodicidade legal.

 

 

 

            Por óbvio que os aumentos  periódicos dos valores do aluguel, desde que observado o que determina a lei,  não importarão  seja  em novação, seja em transação, e muito menos moratória.

 

 

6.         No entanto,  em contrário a esses esdrúxulos entendimentos certos julgados do Superior Tribunal de Justiça já afirmavam que “se há específica e expressa disposição contratual, prevendo a responsabilidade dos fiadores na hipótese de o contrato passar a ser por prazo indeterminado, e até a entrega das chaves, não há interpretação a fazer, muito menos restritiva.”

 

            E acrescentamos nós:  muito menos equivocada e contrária a expressas regras legais especiais !.

 

 

            Felizmente,  os entendimentos dos  desavisados  tiveram o fim que mereciam.

 

 

7.         Com efeito,  na sessão realizada no dia 22 de novembro de 2006, a TERCEIRA SEÇÃO, do SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, no julgamento dos Embargos de Divergência  no RESP  566633-CE (registro 2004/0102172-5) colocou uma pá de cal no assunto decidindo que “se o contrato de locação contiver cláusula que obrigue o fiador até a entrega das chaves mesmo na hipótese de prorrogação com contrato, revela que este tinha plena ciência de que o vínculo poderia avançar a prazo  indeterminado, devendo o fiador responder pelos débitos gerados pelo afiançado”   

   

 

            Conforme é consabido a Terceira Seção  é composta pelas 5a. e 6a. Turmas,  as quais são competentes para  conhecer e decidir sobre questões de locação predial urbana.

 

Com essa decisão, restou firmada a jurisprudência sobre o tema.

 

 

8.         Foram  proferidos 05 (cinco) votos favoráveis,   02  (dois)  votos pelo não conhecimento porque  entenderam que  haveria infringência à regra da Sumula 168 do mesmo STJ ao dizer que  “Não cabem embargos de divergência, quando a jurisprudência  do Tribunal se firmou no mesmo sentido do acórdão embargado”,  e  01 (um)  voto contrário.

 

 

            O Ministro  Paulo Medina,  relator do processo,  afastou a incidência da Súmula 214 “uma vez que esta cuida, como ressabido, de hipótese de aditamento contratual, e aquele (arts. 39, § 1° do art. 46;  e parágrafo único  do art. 56 , todos da Lei 8.245/91. Este acréscimo não é do original,) de prorrogação legal e tácita do contrato locatício, hipóteses que não podem ser confundidas”.

 

 

            O Ministro Hélio Quáglia Barbosa  declarou que  “havendo cláusula expressa no contrato de aluguel de que a responsabilidade dos fiadores perdurará até a efetiva devolução das chaves do imóvel da locação, não há falar em desobrigação por partes dos fiadores, apenas por decursos de prazo do respectivo contrato”

 

 

            O Ministro Arnaldo Esteves  manteve a responsabilidade do fiador e argumentou que os acórdãos que deram azo ao nascimento da Súmula 214, tratavam de hipóteses diversas,  porque  coibiram a  execução promovida contra o fiador sobre obrigações que não haviam anuído, fruto de ações de revisão de aluguel em que sequer o fiador fora notificado,  ou até mesmo de ajustes entre o locador e o locatário sem a concordância do fiador. 

 

     

            O Ministro Hamilton Carvalhido  no seu voto  acentuou que “se o fiador, solidário, expressa e voluntariamente se obriga para além do término do contrato,  “não há lugar para interpretação restritiva, com a extinção da fiança, que resultaria, por certo em equivocado dirigismo contratual pelo Poder Judiciário, mas, sim,  para o estrito e literal cumprimento do contrato, em observância mesmo à liberdade de contratar, vigente no sistema pátrio civilista.

 

 

            Por isso, o Ministro Paulo Galotti   ao votar acentuou que o caso era de inaplicabilidade da Súmula 214,  e   que não ocorrera nenhum aditamento advindo de novação, transação  ou moratória que pudesse desobrigar o garante da locação.

 

 

9.         Com o resultado desses 05 (cinco) votos, além de restado definido, desde que previsto no contrato de locação, que a responsabilidade do fiador “se estende até a efetiva devolução do imóvel”, nos precisos termos do disposto no art. 39 da Lei n° 8.245/91, foi determinado pelo Ministro  Nilson Naves, Presidente da Terceira Seção a remessa dos autos à Comissão de Jurisprudência do STJ  para  melhor adequação da Sumula 214.

 

 

10.      Registre-se, por fim, que o desiderato resultado pelo julgamento do ERESP 566633  deve-se ao incessante trabalho técnico desenvolvido pelos membros da CBCSI - CÂMARA BRASILEIRA  DE COMÉRCIO E SERVIÇOS IMOBILIARIOS, constituída  pelos SECOVI,s de todos os Estados Brasileiros, e por diversas associações, inclusive a ABAMI – Associação Brasileira de Advogados do Mercado Imobiliário,  tendo como Coordenador e timoneiro o dr. Pedro Whähmann, Presidente do SECOVI do Rio de Janeiro e  como “costurador” o dr. Leanbro  Ibagy e a excelente atuação profissional dos advogados dr. Helio Mossimann, dr. Roberto Rosas e dr. José Perdiz.

 

 

11.      Esperamos que essa decisão da Terceira Seção do STJ venha tranqüilizar o mercado da locação, em favor dos locadores e dos locatários, porque deverá haver plena segurança jurídica nas relações locatícias, como aquela almejada pela Lei do Inquilinato, vigente há 15 anos e reconhecida  no meio jurídico, como a “LEI DA PAZ”.

 

 

Rio, novembro de 2006

 

Geraldo Beire Simões.

 

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